Se alguém quiser conhecer a qualidade dos peixes e mariscos em Portugal não hesito em recomendar o novo menu Costa a Costa que Henrique Sá Pessoa está a apresentar no seu restaurante Alma, em Lisboa, duas estrelas Michelin. Eu sei que não é barato, fica em 160 euros por pessoa, mas vale por não sei quantas douradas grelhadas, robalos assados e lagostas cozidas que se possam idealizar. Lírio, tamboril, pescada, pregado, mexilhão, carabineiro desfilam esplendidamente com os seus pontos de cozedura surpreendentes e magníficos, em diversas preparações certeiras que fazem sempre sobressair uma enorme qualidade. Por feliz coincidência, uma semana depois de ser convidado a conhecer a mais recente versão deste menu que Sá Pessoa vai renovando há já alguns anos no seu principal restaurante, fui igualmente convidado a conhecer o menu com que ele se está a estrear no restaurante do Vinha Boutique Hotel, em Vila Nova de Gaia, à beira do Douro, aberto há menos de um ano. É uma cozinha menos arrebatadora, mas igualmente brilhante, capaz de agradar aos palatos mais desconfiados dos méritos dos nossos chefes.
Uns dias depois desta última ocasião, Henrique Sá Pessoa seguia para a Áustria, onde o conhecido restaurante Hangar-7, gerido pela Red Bull no aeroporto de Salzburgo, com duas estrelas Michelin, vai tê-lo como chefe convidado ao longo deste mês de Maio. Depois de Dieter Koschina, Hans Neuner, Joachim Koerper e José Avillez, é a sua vez de representar a cozinha que se faz em Portugal neste restaurante por onde já passaram, como convidados mensais, alguns dos mais prestigiados chefes do mundo. Segundo me disse, combinou com Martin Klein, chefe executivo do Hangar-7, que o menu seria constituído por uma mistura de pratos do menu Costa a Costa com os do menu principal do Alma.
Falei com Sá Pessoa antes de ele embarcar, para saber como iam as coisas no seu restaurante Chiado, em Macau (estava a ir bem, mas teve que encerrar devido às drásticas restrições que as autoridades chinesas estão ainda a impor por causa da pandemia), numa parceria com os casinos Sands, e no Arca (que tem uma cozinha parecida com a do Tapisco), aberto em Novembro em Amesterdão, que vai tão bem que o grupo hoteleiro já o convidou para ser igualmente consultor da nova unidade que vão abrir em Londres lá para o final do ano. E, é claro, com o fim das restrições e a volta dos turistas, os outros restaurantes que tem em Lisboa com o grupo Plateform – Tapisco, Cais da Pedra (recentemente renovado), Mercado da Ribeira, El Corte Inglès – estão de vento em popa, tal como o Atelier, em Marvila, dedicado a refeições privadas e eventos, também muito procurado.
Acrescem a isto novas temporadas do seu programa televisivo “Comtradição”, no 24Kitchen, agora dedicadas a pratos internacionais, que, através da Disney +, está a ser transmitido em 15 países. E ainda várias deslocações a eventos em Portugal e no exterior, caso do Madrid Fusión, onde se apresentou em finais de Março. “Foi uma fase louca, mas agora, mal termine o mês no Hangar-7, vou focar-me no Alma”, garantiu-me este chefe, de 45 anos, que parece manter a serenidade entre tantas tarefas em tantos locais do mundo. “Tenho a vantagem de estar sempre apoiado por grupos de restauração e de hotelaria e por pessoas que trabalham comigo há muitos anos, como é o caso do Alma, com o Daniel Costa”, explica.
Pescada com aipo nabo, cebolo e molho de ostra
E é precisamente ao Alma que volto para recordar um almoço deslumbrante, que se iniciou com propostas longe do mar, com excelentes aperitivos como crocante de tapioca, couve e mayo bbq (molho à base de maionese e molho barbecue), tartelete de pato, lentilhas e vinho do Porto, porco piri-piri (leitão desidratado sobre a pele igualmente desidratada) e os seus já clássicos e deliciosos pimentos em tempura com gel de vinagre fumado, uma das mais felizes maneiras que conheço de apreciar este vegetal, que julgo que está no menu desde que o Alma abriu no Chiado, em 2015.
Começou então o menu Costa a Costa propriamente dito com lírio do Açores, dashi de tomate, capuchinhas e shimeji e os peixes começaram a brilhar. O lírio tinha sido apenas curado e ligeiramente braseado, conferindo-lhe uma textura soberba e um sabor que se conjugava na perfeição com o caldo leve e os cogumelos. Menos entusiasmante estava a muxama, com couve-roxa em puré e nori, onde teria gostado de sentir mais o sabor do atum. E para encerrar esta fase e preparar para a posterior, nada como a acidez refrescante do sorbet de tomate que surgiu então na mesa, logo seguido do “momento do pão”, do tipo alentejano, feito na Gleba e finalizado localmente, com manteiga caseira fumada sem excessos.
Sopa de cebola com tamboril, mexilhão e caviar
O esplendor do mar português retornou então sob a forma de uma curiosa sopa de cebola com tamboril, mexilhão e caviar. Pus-me a pensar e não me lembrei de ter provado sopa de cebola a não ser na versão clássica francesa com queijo e pão. Temi pelo pior, com a cebola a sobrepor-se a tudo o mais, mas qual o quê. O tamboril estava sensacional, num inesperado ponto de cozedura muito mais curto do que o habitual, o mexilhão igualmente cozido leve e perfeitamente – poderia comer esta sopa todos os dias! Bem, todas as semanas, gosto de variar… Parece que a versão original leva algas, que dispensei e que não me fizeram falta nenhuma.
Igualmente dispensáveis eram as algas no prato seguinte, tal a intensidade marítima do carabineiro com açorda, novo ponto inigualável para o marisco, açorda cremosa magnífica, conjunto vitorioso que mostra que preparações contemporâneas de clássicos portugueses são dignas do mais exigente dos inspectores Michelin. Menos vista é a pescada nestas mesas requintadas, mas Sá Pessoa não se está pelos ajustes e serviu-a em ponto imaculado com aipo nabo, cebolo e molho de ostra, outro prato que me fez sair ejectado do mar até ao céu, qual míssil de submarino. Já o pregado não é propriamente raro de ver na restauração de luxo, tanto mais que vinha com trufa preta, boletos e uma original raiz de salsa, que deu um tom diferente a este prato que encerrava o menu, com o curto ponto de cozedura do peixe (tão inesperado e feliz quanto o do tamboril) a mostrar como temos ainda muito a fazer para valorizar o que nos dão as nossas abençoadas costas atlânticas.
O Boutique Vinha Hotel com a parte antiga, onde fica o restaurante, e a parte moderna com os quartos
Sem perder tempo, sigo já para o Porto, mais precisamente para Vila Nova de Gaia. O cinco estrelas Boutique Vinha Hotel situa-se numa propriedade mesmo sobre o Douro, adquirida há cerca de 10 anos por uma família ligada à construção civil que ali edificou uma parte moderna que tem como centro um antigo palacete onde fica o agradável e acolhedor restaurante Vinha. Começou por ter Renato Cunha, do Ferrugem (Famalicão), como chefe consultor, agora substituído por Henrique Sá Pessoa. O projecto, que abrange 38 quartos, piscina, spa e bar, é da autoria de um dos membros da família proprietária, a arquitecta Joana Poças, também responsável pela decoração interior. Fiquei lá hospedado e gostei imenso, quer pela amabilidade do pessoal quer pela qualidade das instalações, a vista, o bar – onde tomei um cocktail muito bem preparado e explicado – e ainda um óptimo pequeno-almoço (o qual, incluiu uns fantásticos ovos Benedict que me propuseram, destacando-se o ovo escalfado na perfeição e um molho holandês ligeiro e pouco engordurado), que só poderia ter sido melhor se esta fria Primavera convidasse a ficar nos terraços ao ar livre, circundados pelos agradáveis jardins e com vista para o rio. Adivinha-se que será um óptimo local com o tempo mais quente, mesmo para não hóspedes, e o hotel sabe disso, propondo, entre as 12h30 e as 16h dos primeiros domingos de cada mês, um brunch por 35 euros por pessoa, com serviço buffet (Reserva obrigatória através dos tels. 221 154 122 ou 912 629 647).
Mas vamos ao jantar no Vinha, dedicado a apresentar o Menu Degustação à Comunicação Social. Tem só cinco pratos, como é habitual nos restaurantes de Sá Pessoa, que me disse – “Acho que já ninguém está interessado em menus de 25 ou 30 pratos, que nos fazem passar quatro horas à mesa, de que depois já nem nos lembramos bem. Fora em Espanha, creio que a tendência é de menus mais curtos”. Por falar em tendências, o chefe também não vai muito na onda vegetal – “Sempre tive um forte componente vegetal na minha cozinha, admiro quem está a fazer menus vegetarianos, mas a minha cozinha não é essa”.
O menu começou com salada de figo (conserva de pingo de mel) com queijo de cabra, nozes caramelizadas e uma selecção de folhas frescas, que ainda levava maçã, tudo bem temperado e equilibrado, sem doçuras excessivas. Depois, azevia (linguado pequeno) belissimamente cozida ao vapor, com não menos belíssimas ervilhas inteiras e em puré, chouriço e molho holandês, um prato no qual o peixe desapareceu um pouco, mas que ganha no conjunto dos ingredientes. Já o lombo de robalo com arroz de carabineiro e azeite de malagueta estava superlativo, é impossível não gostar deste prato onde tudo está bem feito e harmonioso. Por fim, um cabrito assado, com batata fondant, grelos e jus de tomilho, com a carne trabalhada em separado da pele crocante, outro que só poderá desagradar a vegetarianos. Para compensar, o pudim Abade de Priscos da sobremesa vem numa versão que não leva toucinho nem presunto, estando acompanhado por um sorbet de citrinos. Este menu custa 70 euros, mas no Vinha, tal como no Alma, também se poder pedir à carta.
Cabrito assado, batata fondant, grelos e jus de tomilho
Há harmonizações com vinhos que podem valer a pena, a julgar pelo que serviram, nomeadamente dois brancos que não conhecia e que me encantaram, um da Real Companhia Velha, proveniente da casta samarrinho cultivada em Alijó, e um Malvarinto de Janas 2018, que, como o nome indica, leva malvasia e arinto e passa pela madeira, incluindo de carvalho americano. De referir que na competente equipa de escanções da casa há uma refugiada ucraniana, que já desempenhava funções idênticas no seu país, sendo que um dos edifícios desta unidade hoteleira alberga actualmente várias famílias de lá provenientes.
Resumindo, apreciei muito este reencontro com a cozinha de Henrique Sá Pessoa. Fiquei ainda mais satisfeito por parecer que ele está a conseguir conciliar um justo destaque mediático e uma fase de expansão, inclusive internacional, com a evolução da cozinha do Alma, o restaurante-fundador de todo este “império”, onde mantém a chama acesa e uma ambição tranquila e saudável de chegar mais longe. Terceira estrela Michelin à vista? Sá Pessoa diz que é claro que gostaria, mas que não vive obcecado com isso, que para já o seu objectivo principal é consolidar esta expansão e manter a equipa do Alma motivada e consistente. Vão até passar a fechar ao domingo, além da segunda-feira, justamente para evitar demasiado desgaste, tanto mais que também estão a ser afectados pela falta de mão-de-obra que atinge o sector. “Ganhámos duas estrelas muito rapidamente, não posso estar à espera que a terceira venha logo. Mesmo chefes com o prestígio do Joan Roca ou do Quique Dacosta esperaram anos e anos pela terceira”, sublinha. Pois eu acho que talvez devesse vir mais cedo do que tarde e que o guia Michelin só ganharia em reconhecê-lo. E no Vinha, se se conseguir manter o nível que lá encontrei, acho que uma estrela também não ficaria nada mal.
A sala do Vinha
Vinha
Morada: Vinha Boutique Hotel, Rua Quinta Fonte da Vinha, 383, Vila Nova de Gaia Tel.: 221 154 122 ou 912 629 647
Se alguém quiser conhecer a qualidade dos peixes e mariscos em Portugal não hesito em recomendar o novo menu Costa a Costa que Henrique Sá Pessoa está a apresentar no seu restaurante Alma, em Lisboa, duas estrelas Michelin. Eu sei que não é barato, fica em 160 euros por pessoa, mas vale por não sei quantas douradas grelhadas, robalos assados e lagostas cozidas que se possam idealizar. Lírio, tamboril, pescada, pregado, mexilhão, carabineiro desfilam esplendidamente com os seus pontos de cozedura surpreendentes e magníficos, em diversas preparações certeiras que fazem sempre sobressair uma enorme qualidade. Por feliz coincidência, uma semana depois de ser convidado a conhecer a mais recente versão deste menu que Sá Pessoa vai renovando há já alguns anos no seu principal restaurante, fui igualmente convidado a conhecer o menu com que ele se está a estrear no restaurante do Vinha Boutique Hotel, em Vila Nova de Gaia, à beira do Douro, aberto há menos de um ano. É uma cozinha menos arrebatadora, mas igualmente brilhante, capaz de agradar aos palatos mais desconfiados dos méritos dos nossos chefes.
Uns dias depois desta última ocasião, Henrique Sá Pessoa seguia para a Áustria, onde o conhecido restaurante Hangar-7, gerido pela Red Bull no aeroporto de Salzburgo, com duas estrelas Michelin, vai tê-lo como chefe convidado ao longo deste mês de Maio. Depois de Dieter Koschina, Hans Neuner, Joachim Koerper e José Avillez, é a sua vez de representar a cozinha que se faz em Portugal neste restaurante por onde já passaram, como convidados mensais, alguns dos mais prestigiados chefes do mundo. Segundo me disse, combinou com Martin Klein, chefe executivo do Hangar-7, que o menu seria constituído por uma mistura de pratos do menu Costa a Costa com os do menu principal do Alma.
Falei com Sá Pessoa antes de ele embarcar, para saber como iam as coisas no seu restaurante Chiado, em Macau (estava a ir bem, mas teve que encerrar devido às drásticas restrições que as autoridades chinesas estão ainda a impor por causa da pandemia), numa parceria com os casinos Sands, e no Arca (que tem uma cozinha parecida com a do Tapisco), aberto em Novembro em Amesterdão, que vai tão bem que o grupo hoteleiro já o convidou para ser igualmente consultor da nova unidade que vão abrir em Londres lá para o final do ano. E, é claro, com o fim das restrições e a volta dos turistas, os outros restaurantes que tem em Lisboa com o grupo Plateform – Tapisco, Cais da Pedra (recentemente renovado), Mercado da Ribeira, El Corte Inglès – estão de vento em popa, tal como o Atelier, em Marvila, dedicado a refeições privadas e eventos, também muito procurado.
Acrescem a isto novas temporadas do seu programa televisivo “Comtradição”, no 24Kitchen, agora dedicadas a pratos internacionais, que, através da Disney +, está a ser transmitido em 15 países. E ainda várias deslocações a eventos em Portugal e no exterior, caso do Madrid Fusión, onde se apresentou em finais de Março. “Foi uma fase louca, mas agora, mal termine o mês no Hangar-7, vou focar-me no Alma”, garantiu-me este chefe, de 45 anos, que parece manter a serenidade entre tantas tarefas em tantos locais do mundo. “Tenho a vantagem de estar sempre apoiado por grupos de restauração e de hotelaria e por pessoas que trabalham comigo há muitos anos, como é o caso do Alma, com o Daniel Costa”, explica.
E é precisamente ao Alma que volto para recordar um almoço deslumbrante, que se iniciou com propostas longe do mar, com excelentes aperitivos como crocante de tapioca, couve e mayo bbq (molho à base de maionese e molho barbecue), tartelete de pato, lentilhas e vinho do Porto, porco piri-piri (leitão desidratado sobre a pele igualmente desidratada) e os seus já clássicos e deliciosos pimentos em tempura com gel de vinagre fumado, uma das mais felizes maneiras que conheço de apreciar este vegetal, que julgo que está no menu desde que o Alma abriu no Chiado, em 2015.
Começou então o menu Costa a Costa propriamente dito com lírio do Açores, dashi de tomate, capuchinhas e shimeji e os peixes começaram a brilhar. O lírio tinha sido apenas curado e ligeiramente braseado, conferindo-lhe uma textura soberba e um sabor que se conjugava na perfeição com o caldo leve e os cogumelos. Menos entusiasmante estava a muxama, com couve-roxa em puré e nori, onde teria gostado de sentir mais o sabor do atum. E para encerrar esta fase e preparar para a posterior, nada como a acidez refrescante do sorbet de tomate que surgiu então na mesa, logo seguido do “momento do pão”, do tipo alentejano, feito na Gleba e finalizado localmente, com manteiga caseira fumada sem excessos.
O esplendor do mar português retornou então sob a forma de uma curiosa sopa de cebola com tamboril, mexilhão e caviar. Pus-me a pensar e não me lembrei de ter provado sopa de cebola a não ser na versão clássica francesa com queijo e pão. Temi pelo pior, com a cebola a sobrepor-se a tudo o mais, mas qual o quê. O tamboril estava sensacional, num inesperado ponto de cozedura muito mais curto do que o habitual, o mexilhão igualmente cozido leve e perfeitamente – poderia comer esta sopa todos os dias! Bem, todas as semanas, gosto de variar… Parece que a versão original leva algas, que dispensei e que não me fizeram falta nenhuma.
Igualmente dispensáveis eram as algas no prato seguinte, tal a intensidade marítima do carabineiro com açorda, novo ponto inigualável para o marisco, açorda cremosa magnífica, conjunto vitorioso que mostra que preparações contemporâneas de clássicos portugueses são dignas do mais exigente dos inspectores Michelin. Menos vista é a pescada nestas mesas requintadas, mas Sá Pessoa não se está pelos ajustes e serviu-a em ponto imaculado com aipo nabo, cebolo e molho de ostra, outro prato que me fez sair ejectado do mar até ao céu, qual míssil de submarino. Já o pregado não é propriamente raro de ver na restauração de luxo, tanto mais que vinha com trufa preta, boletos e uma original raiz de salsa, que deu um tom diferente a este prato que encerrava o menu, com o curto ponto de cozedura do peixe (tão inesperado e feliz quanto o do tamboril) a mostrar como temos ainda muito a fazer para valorizar o que nos dão as nossas abençoadas costas atlânticas.
Sem perder tempo, sigo já para o Porto, mais precisamente para Vila Nova de Gaia. O cinco estrelas Boutique Vinha Hotel situa-se numa propriedade mesmo sobre o Douro, adquirida há cerca de 10 anos por uma família ligada à construção civil que ali edificou uma parte moderna que tem como centro um antigo palacete onde fica o agradável e acolhedor restaurante Vinha. Começou por ter Renato Cunha, do Ferrugem (Famalicão), como chefe consultor, agora substituído por Henrique Sá Pessoa. O projecto, que abrange 38 quartos, piscina, spa e bar, é da autoria de um dos membros da família proprietária, a arquitecta Joana Poças, também responsável pela decoração interior. Fiquei lá hospedado e gostei imenso, quer pela amabilidade do pessoal quer pela qualidade das instalações, a vista, o bar – onde tomei um cocktail muito bem preparado e explicado – e ainda um óptimo pequeno-almoço (o qual, incluiu uns fantásticos ovos Benedict que me propuseram, destacando-se o ovo escalfado na perfeição e um molho holandês ligeiro e pouco engordurado), que só poderia ter sido melhor se esta fria Primavera convidasse a ficar nos terraços ao ar livre, circundados pelos agradáveis jardins e com vista para o rio. Adivinha-se que será um óptimo local com o tempo mais quente, mesmo para não hóspedes, e o hotel sabe disso, propondo, entre as 12h30 e as 16h dos primeiros domingos de cada mês, um brunch por 35 euros por pessoa, com serviço buffet (Reserva obrigatória através dos tels. 221 154 122 ou 912 629 647).
Mas vamos ao jantar no Vinha, dedicado a apresentar o Menu Degustação à Comunicação Social. Tem só cinco pratos, como é habitual nos restaurantes de Sá Pessoa, que me disse – “Acho que já ninguém está interessado em menus de 25 ou 30 pratos, que nos fazem passar quatro horas à mesa, de que depois já nem nos lembramos bem. Fora em Espanha, creio que a tendência é de menus mais curtos”. Por falar em tendências, o chefe também não vai muito na onda vegetal – “Sempre tive um forte componente vegetal na minha cozinha, admiro quem está a fazer menus vegetarianos, mas a minha cozinha não é essa”.
O menu começou com salada de figo (conserva de pingo de mel) com queijo de cabra, nozes caramelizadas e uma selecção de folhas frescas, que ainda levava maçã, tudo bem temperado e equilibrado, sem doçuras excessivas. Depois, azevia (linguado pequeno) belissimamente cozida ao vapor, com não menos belíssimas ervilhas inteiras e em puré, chouriço e molho holandês, um prato no qual o peixe desapareceu um pouco, mas que ganha no conjunto dos ingredientes. Já o lombo de robalo com arroz de carabineiro e azeite de malagueta estava superlativo, é impossível não gostar deste prato onde tudo está bem feito e harmonioso. Por fim, um cabrito assado, com batata fondant, grelos e jus de tomilho, com a carne trabalhada em separado da pele crocante, outro que só poderá desagradar a vegetarianos. Para compensar, o pudim Abade de Priscos da sobremesa vem numa versão que não leva toucinho nem presunto, estando acompanhado por um sorbet de citrinos. Este menu custa 70 euros, mas no Vinha, tal como no Alma, também se poder pedir à carta.
Há harmonizações com vinhos que podem valer a pena, a julgar pelo que serviram, nomeadamente dois brancos que não conhecia e que me encantaram, um da Real Companhia Velha, proveniente da casta samarrinho cultivada em Alijó, e um Malvarinto de Janas 2018, que, como o nome indica, leva malvasia e arinto e passa pela madeira, incluindo de carvalho americano. De referir que na competente equipa de escanções da casa há uma refugiada ucraniana, que já desempenhava funções idênticas no seu país, sendo que um dos edifícios desta unidade hoteleira alberga actualmente várias famílias de lá provenientes.
Resumindo, apreciei muito este reencontro com a cozinha de Henrique Sá Pessoa. Fiquei ainda mais satisfeito por parecer que ele está a conseguir conciliar um justo destaque mediático e uma fase de expansão, inclusive internacional, com a evolução da cozinha do Alma, o restaurante-fundador de todo este “império”, onde mantém a chama acesa e uma ambição tranquila e saudável de chegar mais longe. Terceira estrela Michelin à vista? Sá Pessoa diz que é claro que gostaria, mas que não vive obcecado com isso, que para já o seu objectivo principal é consolidar esta expansão e manter a equipa do Alma motivada e consistente. Vão até passar a fechar ao domingo, além da segunda-feira, justamente para evitar demasiado desgaste, tanto mais que também estão a ser afectados pela falta de mão-de-obra que atinge o sector. “Ganhámos duas estrelas muito rapidamente, não posso estar à espera que a terceira venha logo. Mesmo chefes com o prestígio do Joan Roca ou do Quique Dacosta esperaram anos e anos pela terceira”, sublinha. Pois eu acho que talvez devesse vir mais cedo do que tarde e que o guia Michelin só ganharia em reconhecê-lo. E no Vinha, se se conseguir manter o nível que lá encontrei, acho que uma estrela também não ficaria nada mal.
Vinha
Morada: Vinha Boutique Hotel, Rua Quinta Fonte da Vinha, 383,
Vila Nova de Gaia
Tel.: 221 154 122 ou 912 629 647
E-mail: geral@vinhaboutiquehotel.com
Horários: Aberto para jantar de terça-feira a sábado. Abre para almoço aos fins de semana. Fecha à segunda-feira o dia todo e domingo ao jantar
Web: www.vinhaboutiquehotel.com
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