Não encaro com grande entusiasmo jantares a quatro mãos – e, ainda menos, a seis mãos -, que muitas vezes me parecem incoerentes e confusos, que muitas vezes prometem mais do que cumprem. Neste caso, porém, acho que é de abrir uma excepção, já que são três jovens chefes portugueses que estão a desenvolver com com competência projectos cheios de personalidade, numa fase inicial das respectivas carreiras, em pequenos restaurantes de Lisboa que não vão em modas, onde em vez de “discursos” para os quais já não há pachorra (o ambiente, o desperdício, a pegada ecológica, o “saudável”) nos servem sobretudo pratos bem feitos. Os chefes em questão são o anfitrião, Tiago Rosa, do Terroir, Vítor Adão, do Plano, e Mateus Freire, do Osso Bento, que apresentam na próxima quinta-feira, dia 25, um menu a seis mãos que custa 100 euros por pessoa, incluindo harmonização de vinhos. Segundo o comunicado que divulga a iniciativa, vão ser “celebrados” os produtos portugueses, o que fica sempre bem, por muito que seja um mote já um pouco visto, para não dizer outra coisa.
O Terroir, onde decorre o jantar, foi das boas surpresas que tive nos últimos tempos. Fica na Rua dos Fanqueiros, nº186, já a chegar à Praça da Figueira, e se há zona de Lisboa que precisa urgentemente de melhorar a sua oferta gastronómica é a Baixa, onde, perdidos quase todos os restaurantes tradicionais, vigoram geralmente estabelecimentos de cozinha indistinta e de baixo nível, algo ainda mais grave quando se sabe que continua a ser uma das zonas preferidas dos turistas. Por isso, é de saudar a coragem do empresário Erik Ibrahim e da sua mulher, que, em Agosto de 2020, em plena pandemia, abriram este espaço, decorando-o convenientemente e apostando numa cozinha contemporânea e personalizada que, numa fase inicial, coube ao chefe José Lopes. Com a saída deste para chefiar o estrelado Bon Bon, no primeiro trimestre de 2021 convidaram Tiago Rosa para assumir a cozinha.
Nascido em Benavente, Tiago Rosa já conta com um currículo bem interessante para os seus 26 anos de idade, tendo passado pelas cozinhas do Vila Joya, do Ocean, do Eleven, onde esteve três anos, e da Fortaleza do Guincho (com Miguel Rocha Vieira e Gil Fernandes) onde chegou a sub-chefe. Foi depois aventurar-se na Islândia, no Norõ Austur, voltou a Portugal para um breve período no Belcanto e partiu para os Países Baixos, para o Pure C (duas estrelas Michelin), o restaurante que o famoso chefe Sergio Herman abriu depois de ter fechado o seu três estrelas Oud Sluis. Felizmente, decidiu voltar para Lisboa para assumir a sua primeira chefia, no Terroir, por indicação do anterior chefe, com quem tinha trabalhado no Eleven.

Todas estas óptimas experiências profissionais traduziram-se no muitíssimo bom jantar que tive no Terroir aqui há uns tempos (entretanto, o menu foi renovado), num convite que fizeram à Comunicação Social para conhecer esta nova fase do restaurante, que passou também pela sua ampliação para um espaço contíguo ao original, com a cozinhas abertas e um extenso balcão. Provei então alguns dos pratos que vão estar no jantar a seis mãos, caso do mexilhão de escabeche e do camarão com acelga e rabanete, logo nas entradas, e um magnífico prato de robalo, batata fumada e beurre blanc (foto de abertura). Tudo a fazer sentido, a combinar bem, tudo bem cozinhado, com atenção aos detalhes, tudo com segurança, a mostrar que temos cozinheiro.
Já que falei do menu, aproveito para mencionar os outros pratos do jantar de quinta-feira. Da autoria de Vítor Adão, que já dispensa apresentações, tal o merecido êxito que o seu Plano tem conseguido, nas entradas há ouriço, coentros e creme de alho, cabendo-lhe também o prato principal de carne: presa de porco alentejano, topinambur e tutano. E ainda uma das duas sobremesas, rabanada, creme de aletria e romã. Conheço pior Mateus Freire, já que apenas provei os seus pratos no Faz Frio e ainda não fui ao Osso Bento. Julgo que no Faz Frio a sua cozinha estava algo espartilhada pelo conceito deste antigo restaurante lisboeta, que teve porém o enorme mérito de recuperar. Quem quiser saber o que ele anda a fazer agora, poderá provar duas entradas – croquete de pato com paté de fígado e escabeche de perdiz com aipo – e uma sobremesa de abacaxi e poejo. De referir ainda que a parte dos vinhos fica nas mãos da escanção Magda Martins, coadjuvada pelo chefe de sala Fernando Carrilho, ambos com boas experiências profissionais anteriores, nomeadamente na Casa de Chá da Boa Nova, de Rui Paula. Ou seja, por muitas mãos que estejam envolvidas, parece que tem tudo para ser um belíssimo jantar. Reservas: 926 312 647

Fotografias: Gabriel Vieira
Bom dia Duarte,
Ao contrário do que escreves, eu acho é que já não há “pachorra”, nem tempo para perder mais tempo a “convencer”, para quem ainda pensa e/ou escreve que são modas e “discursos” o ambiente, o desperdício, a pegada ecológica,
Tenho a esperança que não queiras dizer, ou “não queiras bem dizer”, o que escreveste.
Ou, que seja erro meu na interpretação.
abraço do Douro,
joão roseira
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Olá, João. Não está em causa a justeza desses discursos – quase toda a gente, incluindo eu, está de acordo com eles -, mas sim serem muitas vezes utilizados para esconder uma certa mediocridade culinária. Abraço
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