Notas Restaurantes

A feliz renovação do escalabitano Oh! Vargas

Descobri recentemente mais um motivo para visitar gastronomicamente Santarém. Já tinha o Ó Balcão, onde o chefe Rodrigo Castelo desenvolve um notável trabalho de valorização dos produtos e do receituário local, e ouvi falar bem do Dois Petiscos e do Amassa (e seguramente existirão outros que merecem visita), mas onde estive foi no Oh! Vargas, do chefe Rui Lima Santos, convidado para um almoço onde se apresentaram algumas novidades de uma extensa lista de pratos. Fiquei muito bem impressionado com uma cozinha ancorada em sabores que conhecemos bem, porém com espaço para o contemporâneo e para o inesperado, numa casa nos arredores de Santarém cuja origem remonta aos anos 1950, fundado pelo avô do actual proprietário, que em 1973 os seus pais transformaram oficialmente em restaurante e que há cerca de três anos foi muito bem remodelado já pela mão do herdeiro da família, Manuel Vargas, e da sua mulher Teresa Esteves.

O chefe escalabitano Rui Lima Santos está de volta à sua cidade

O Oh Vargas está dividido em três espaços. Há uma sala principal (na última foto), que dá para uma cozinha aberta num piso inferior, de muito bom aspecto, e que exibe uma das paredes coberta de prateleiras iluminadas com garrafas de vinho, uma das apostas da casa, com muitas referências ribatejanas e alentejanas. Depois, uma sala reservada a grupos ou que serve de extensão à sala principal quando a procura o justifica, com paredes cheias de fotografias de toureiros, forcados e touradas, o que para mim está muito bem. Finalmente, um agradável espaço exterior coberto por uma glicínia centenária (foto de abertura), onde se pode fumar à vontade, sobretudo os apreciadores de charutos e cigarrilhas da Casa Havaneza, com quem o restaurante tem parceria. Também me parece muito bem.

Cachorrinho de txistorra, lembranças deliciosas do País Basco

Indo para a mesa, o almoço começou com dois clássicos da casa, uns croquetes de novilho com mostarda, bem fritos, infelizmente com a carne desfiada (alguém fez desaparecer os moinhos de carne dos restaurantes portugueses) e um presunto ibérico Maldonado, servido à temperatura ambiente, que é o que se quer. A primeira surpresa, deliciosa, surgiu de seguida, um cachorrinho de txistorra, um típico enchido basco, no qual Rui Lima Santos lembra a sua passagem de seis meses pela cozinha do San Mamés Jatetxea, em Bilbau.

A paleta de borrego é cozinhada durante 48 horas

Já agora, diga-se que o chefe, de 35 anos, é escalabitano, e começou por se interessar por cozinha japonesa, estando inicialmente ligado a empresas de prestação de serviços na restauração, como a Kok e a Wasabi, esta já em Lisboa, onde chegou a abrir um restaurante de mesmo nome em Campo de Ourique. Fez depois a Escola de Hotelaria do Estoril, passou por Bilbau, depois pelo Arola, no hotel da Penha Longa, em Sintra, chefiou o espaço de cozinha japonesa da Bica do Sapato, em Lisboa, durante cerca de um ano, mudou para o Porto de Santa Maria, no Guincho, na altura chefiado por Miguel Laffan, e – antes de voltar para a sua cidade e começar no Oh! Vargas, em 2021 –  esteve no triénio 2017/18/19 como “chefe do comboio” The Presidential, no Douro, apoiando os vários chefes que ali se apresentavam.

O óptimo arroz de forno que acompanha a paleta é cozido num caldo com diversos enchidos

Voltando à mesa do Oh! Vargas, o almoço prosseguiu com duas novidades que me pareceram menos felizes, uma algo desinteressante omelete “aberta” de bacalhau fumado, onde havia pimentão a mais, e um franguinho à moda da Bairrada, com o típico molho a bom nível, mas com a carne um pouco seca. Porém, a novidade seguinte repôs a felicidade, um escabeche de coelho de perfeito equilíbrio, que vinha envolto num taco de milho bem feito, o qual, no entanto, dificultava a tarefa de comer à mão. Muito sabor num cremoso arroz carolino de línguas de bacalhau que se seguiu e uma certa decepção num corriqueiro lombo de bacalhau com batata a murro, salvo por uma belíssima açorda de coentros.

O restaurante é conhecido pela sua selecção de carnes, que inclui um bife de lombo

Os momentos altos voltariam numa paleta de borrego cozinhada durante 48 horas a 63ºC e sobretudo num magnífico arroz de forno que a acompanhava, cozinhado num caldo de enchidos onde figuravam morcela, farinheira, negro e chouriço. Sensacional, de não se conseguir parar de comer. Por fim, um original pão de ló gelado (resultou de um “acidente” que Rui Lima Santos teve num outro restaurante e que passou a adoptar) com rosmaninho e ainda farófias com flor de laranjeira. Acabei por não provar – e não teria estômago para isso – outras apetitosas opções da lista, incluindo as carnes de vaca pelo qual o Oh! Vargas é famoso, incluindo um bife de lombo ou as “maturadas” ou ainda as peças de rubia galega, assim como várias declinações de porco ibérico. Fica para uma das próximas visitas a Santarém, que certamente se seguirão, sendo que este restaurante tem ainda a vantagem de estar aberto todos os dias.

Oh! Vargas

Morada: Estrada Nacional 3, nº28, Portela das Padeiras, Santarém

Tel.: 910 260 743

E-mail: geral@ohvargas.pt

Site: www.ohvargas.pt

Horário: aberto todos os dias para almoço e jantar

Nasceu em Lisboa em 1963. Licenciou-se em Comunicação Social pela Universidade Nova de Lisboa e trabalhou em diversos jornais (Semanário, Diário Popular e Diário de Lisboa) e, depois, na área de comunicação empresarial. Em 1997, começou a colaborar com a revista “Fortuna” na área de gastronomia e vinhos. Em 1999, criou a página “Boa Vida” para o “Diário de Notícias”, que coordenou até Janeiro de 2009, com algumas interrupções. Entre 2007 e 2019, foi coordenador do Projecto Gastronomia da Associação de Turismo de Lisboa e, nesse âmbito, director do festival gastronómico Peixe em Lisboa, continuando a escrever artigos sobre gastronomia e restaurantes em várias publicações.

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