No espaço que já foi o Belcanto e que, com a mudança deste para o outro lado da rua onde se localiza no Chiado, em Lisboa, se tinha transformado há pouco mais de um ano em Canto – um projecto em sociedade com os músicos Ana Moura e António Zambujo que encerrou durante a pandemia – abrirá, lá para meio de Junho, o Encanto. Trata-se do novo projecto do chefe José Avillez, também ele interessado em seguir a tendência actual de apostar numa cozinha muito mais voltada para os vegetais, em detrimento de proteína animal. O restaurante, para já com 30 lugares, apresentará apenas dois menus, um integralmente vegetariano, outro com cerca de 70% de pratos vegetais, mas também com “apontamentos” de proteína animal. Serão cerca de 12 “momentos” em cada um, a preços que deverão variar entre os 95 e os 105 euros por pessoa, bebidas não incluídas, que, além de vinhos bio-dinâmicos, terá uma parte não-alcoólica, com propostas como sumos ou infusões. Quanto à equipa de cozinha, ela será “dividida” com a do Belcanto (duas estrelas Michelin), dando inclusive oportunidade a alguns elementos mais jovens para assumirem outras responsabilidades. Abrirá só ao jantar, de terça-feira a sábado.
“Irrita-me um bocadinho a ideia de que se comermos carne ou peixe estamos a destruir o mundo. Acho que é possível ser sustentável e continuar a consumi-los, desde que o façamos de forma correcta”, afirmou José Avillez ao Mesa Marcada. E sublinha que, ao apostar nesta tendência, não está a fazer uma “declaração política”, mas sim a explorar uma vertente que lhe interessa, que tem implicações no desenvolvimento das relações com os pequenos produtores locais ou de proximidade (eventualmente espanhóis) e de respeito pela sazonalidade e pelo ambiente. “Quando tive esta ideia, em Maio do ano passado, ainda pensei em fazer totalmente vegetariano, mas preferi, em vez de eliminar os produtos de origem animal, apenas reduzir consideravelmente a sua utilização. Num dos menus, poderá haver, por exemplo, um molho de cabeça de carabineiro ou um coração de galinha. Nada de fundamentalismos, que detesto”.
Um dos desafios culinários que a proposta do Encanto coloca é o da valorização dos vegetais em termos gastronómicos, ao nível do que é costume encontrar com carnes e peixes. “Já fiz umas duas ou três cartas, mas como a abertura atrasou, pareceu-me que já não fazia sentido usar certos produtos cuja época, entretanto, tinha passado”, diz José Avillez. Para ele, pensar os vegetais desta maneira foi como “acrescentar cores a uma paleta que estava habituado a usar”, tratando-os como “artistas principais” e não como coadjuvantes. Ele espera que os clientes apreciem o trabalho que esta cozinha implica e não apenas o custo dos produtos que utiliza. “Há muita gente que acha normal gastar dinheiro para parecer bonita, vestir-se bem, comprar relógios caros, mas não em comida, que lhes dá mais saúde”, considera.
Mas é um comportamento que na sua opinião está a alterar-se e que poderá seguir um caminho que ele já observou. “Quando comecei a usar cavala no Tavares [restaurante histórico de Lisboa que chefiou antes do Belcanto e onde ganhou a sua primeira estrela Michelin], ela era extremamente desvalorizada, vendia-se a alguns 20 cêntimos o quilo. Depois, quando os chefes dos melhores restaurantes a incluíram nos seus menus, quando houve várias campanhas de promoção, o preço aumentou a ponto dos pescadores acharem que já valia a pena pescá-la. Penso que com os vegetais se vai passar algo de semelhante”. E, para terminar, o Encanto poderá ganhar estrelas Michelin? “Sendo um restaurante gastronómico, tem todas as possibilidades”, responde José Avillez.
Fotografia: Paulo Barata
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No espaço que já foi o Belcanto e que, com a mudança deste para o outro lado da rua onde se localiza no Chiado, em Lisboa, se tinha transformado há pouco mais de um ano em Canto – um projecto em sociedade com os músicos Ana Moura e António Zambujo que encerrou durante a pandemia – abrirá, lá para meio de Junho, o Encanto. Trata-se do novo projecto do chefe José Avillez, também ele interessado em seguir a tendência actual de apostar numa cozinha muito mais voltada para os vegetais, em detrimento de proteína animal. O restaurante, para já com 30 lugares, apresentará apenas dois menus, um integralmente vegetariano, outro com cerca de 70% de pratos vegetais, mas também com “apontamentos” de proteína animal. Serão cerca de 12 “momentos” em cada um, a preços que deverão variar entre os 95 e os 105 euros por pessoa, bebidas não incluídas, que, além de vinhos bio-dinâmicos, terá uma parte não-alcoólica, com propostas como sumos ou infusões. Quanto à equipa de cozinha, ela será “dividida” com a do Belcanto (duas estrelas Michelin), dando inclusive oportunidade a alguns elementos mais jovens para assumirem outras responsabilidades. Abrirá só ao jantar, de terça-feira a sábado.
“Irrita-me um bocadinho a ideia de que se comermos carne ou peixe estamos a destruir o mundo. Acho que é possível ser sustentável e continuar a consumi-los, desde que o façamos de forma correcta”, afirmou José Avillez ao Mesa Marcada. E sublinha que, ao apostar nesta tendência, não está a fazer uma “declaração política”, mas sim a explorar uma vertente que lhe interessa, que tem implicações no desenvolvimento das relações com os pequenos produtores locais ou de proximidade (eventualmente espanhóis) e de respeito pela sazonalidade e pelo ambiente. “Quando tive esta ideia, em Maio do ano passado, ainda pensei em fazer totalmente vegetariano, mas preferi, em vez de eliminar os produtos de origem animal, apenas reduzir consideravelmente a sua utilização. Num dos menus, poderá haver, por exemplo, um molho de cabeça de carabineiro ou um coração de galinha. Nada de fundamentalismos, que detesto”.
Um dos desafios culinários que a proposta do Encanto coloca é o da valorização dos vegetais em termos gastronómicos, ao nível do que é costume encontrar com carnes e peixes. “Já fiz umas duas ou três cartas, mas como a abertura atrasou, pareceu-me que já não fazia sentido usar certos produtos cuja época, entretanto, tinha passado”, diz José Avillez. Para ele, pensar os vegetais desta maneira foi como “acrescentar cores a uma paleta que estava habituado a usar”, tratando-os como “artistas principais” e não como coadjuvantes. Ele espera que os clientes apreciem o trabalho que esta cozinha implica e não apenas o custo dos produtos que utiliza. “Há muita gente que acha normal gastar dinheiro para parecer bonita, vestir-se bem, comprar relógios caros, mas não em comida, que lhes dá mais saúde”, considera.
Mas é um comportamento que na sua opinião está a alterar-se e que poderá seguir um caminho que ele já observou. “Quando comecei a usar cavala no Tavares [restaurante histórico de Lisboa que chefiou antes do Belcanto e onde ganhou a sua primeira estrela Michelin], ela era extremamente desvalorizada, vendia-se a alguns 20 cêntimos o quilo. Depois, quando os chefes dos melhores restaurantes a incluíram nos seus menus, quando houve várias campanhas de promoção, o preço aumentou a ponto dos pescadores acharem que já valia a pena pescá-la. Penso que com os vegetais se vai passar algo de semelhante”. E, para terminar, o Encanto poderá ganhar estrelas Michelin? “Sendo um restaurante gastronómico, tem todas as possibilidades”, responde José Avillez.
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